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quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Finalmente, Janot diz o óbvio: Reinaldo Azevedo estava certo! Mas o procurador segue parcialmente errado

Eu e Rodrigo Janot não somos exatamente da mesma enfermaria. Temos divergências.
E também algumas convergências. Por exemplo: ambos somos favoráveis à Lava-Jato.

Mas ele defende o uso de prova ilegal em juízo, desde que colhida de boa-fé. Eu não. Ele é a favor de restringir o habeas corpus mais do que se fez durante a ditadura. Eu não. Ele é a favor do teste de honestidade com consequências penais, eu não. Na verdade, acho fascistoides ou comunistoides essas três propostas. Mas temos, sim, um núcleo de concordâncias.

Onde foi mesmo que vocês ouviram falar que esse negócio de anistia a caixa dois era a Loura do Banheiro, o Homem do Saco, um mito — desses feitos para aterrorizar crianças? Acho que foi aqui.

Expliquei a razão. Como o caixa dois passará a ser crime a partir de agora, se a proposta for aprovada, a lei não poderá retroagir porque o Inciso LIX do Artigo 5º da Constituição, que é cláusula pétrea, não deixa.

Cansei de fazer essa afirmação aqui. E tomei porrada, claro!, dos fanáticos da Igreja dos Santos do Ministério Público dos Último Dias. Afinal, se os procuradores combatem a corrupção, vai ver estão sempre certos…

Isso seria o mesmo que você escolher alguém que salvou a sua vida de um afogamento para lhe dar aula de álgebra.

Prestem atenção à fala abaixo:
“Na verdade, o discurso de anistia se refere aos outros crimes que estariam por trás do caixa 2: lavagem de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de dividas. E essa discussão viria nesse sentido. Porque se você cria um crime hoje de caixa 2 esse crime não pode retroagir, é só daqui para frente”.

Não foi o que afirmei aqui?

O arquivo está à disposição.

Mas Janot segue parcialmente errado porque ele sugere — e talvez alguns deputados também acreditem nisso — que seja possível anistiar os demais crimes que podem estar associados ao caixa dois.

Janot sabe que isso é uma impossibilidade. Ainda que isso fosse aprovado, seria vetado pelo Supremo. Qual seria a redação?
1: “Todos os que cometeram caixa dois são poderão ser acusados de caixa dois?”;
2: “Aos acusados de caixa dois não poderão ser imputados os seguintes crimes: etc. etc.”?

Até porque o procurador, que certamente é um homem lógico, teria de atravessar outra questão: então uma doação irregular (caixa dois) de dinheiro sujo estaria automaticamente anistiada, mas uma doação regular (declarada) de também dinheiro sujo ensejaria outras imputações?

O procurador-geral da República tem consciência de que esse debate é ridículo. Infelizmente, está jogando para a plateia — em especial, a plateia incapaz de debater legislação com um mínimo de informação.

A verdade é que Janot e o Ministério Público como um todo usam a questão do caixa dois, com a ajuda involuntária de alguns tontos da Câmara, para demonizar os políticos (todos eles), tentar levar gente às ruas e pressionar para ver se emplaca as 10 medidas na forma imaginada pelo MP.

Às vezes, sou tentando a apoiar essa ideia só para ver o Supremo recusar algumas medidas em razão de sua absoluta inconstitucionalidade.

O procurador-geral fez um apelo pela aprovação do texto original, alegando que há “limites éticos” para alterações legislativas.

Claro que há! Assim como há limites éticos para a atuação de procuradores, juízes, ministros, presidente da República…

Então ficamos assim:
a: lei penal não retroage; logo, não haver a retroação não é anistia, é uma determinação constitucional. Como afirmei aqui;
b: pouco importa o que os deputados incluam na lei, se o dinheiro do caixa dois teve origem criminosa, haverá a imputação do crime.

Com um particular, é claro: o Ministério Público Federal terá de apresentar provas da corrupção, da lavagem, do peculato etc. Não bastará dizer: “Se é caixa dois, então também é tal coisa…”

Mas assim já é hoje em dia.

E fica o desafio para que Janot diga onde está a impropriedade técnica deste texto.

PS: Aliás, até agora, ninguém topou dizer quais trechos da Lei contra Abuso de Autoridade atrapalham a Lava-Jato. Recorre-se apenas à gritaria do coelho do Bambi: “Fogo! Fogo na floresta!”.

PS2 – Como veem, não ligo para o alarido. E acertei.



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