O Senado aprovou uma segunda rodada de repatriação de ativos de brasileiros no exterior. Depois da publicação da lei, os interessados terão 120 dias para fazê-lo. Felizmente, a aprovação se deu afastando uma sem-vergonhice. Mas também é preciso que se reconheça um pequeno problema. Vamos ver.
Na proposta original de Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo, os parentes dos políticos, em qualquer grau, poderiam optar pela legalização de ativos no exterior. O Senado reagiu e iria derrotar esse item da proposta. O próprio senador recuou. Agora, os tais parentes não terão direito aos benefícios da repatriação.
Antes que entre em outros detalhes, vamos lá. É claro que a proposta de Jucá não poderia ser aceita. Não é segredo pra ninguém que há políticos que usam familiares como laranjas, certo? Dado que eles não podem fazer repatriação, é evidente que se levantaria imediatamente a suspeita de que usariam parentes para isso.
Por outro lado, é certo que ninguém é culpado por princípio pelos parentes que tem. Pergunta-se: seria justo “punir” pessoas que não podem responder por lanços familiares que não são de sua escolha? Vamos com calma!
Estamos falando de pessoas que cometeram um ilícito, que deixaram de declarar dinheiro ou bens à Receita, que enviaram recursos ao exterior de modo ilegal. Ainda que os parentes de políticos possam eventualmente ser prejudicados numa abordagem meramente comparativa (isto é, no cotejo com pessoas que não vivem essa condição), é claro que é preferível a proibição à permissão.
O projeto original também não trazia o percentual que seria repassado aos Estados, o que foi incluído pelos senadores: 46% da multa e 49% do Imposto de Renda. As alíquotas também mudaram em relação à primeira rodada. Estão mais elevadas: 17,5% para cada taxação. No primeiro ciclo, as duas alíquotas eram de 15%. O governo espera arrecadar, nesta segunda rodada, ao menos R$ 30 bilhões.
Jucá ainda tentou um argumento matador para permitir a repatriação de ativos também dos parentes dos políticos, mas pode ter sido um pouco infeliz no argumento. Disse ele:
“É inconcebível que o irmão do traficante Fernandinho Beira-Mar tenha a possibilidade de repatriar recursos, enquanto o sobrinho do ex-senador Eduardo Suplicy (PT-SP), não”.
Pois é… Na aparência, parece convincente. Quando se vê de perto, nota-se que o senador, sem querer, põe numa mesma escala, ainda que em posições certamente distantes, o político e um dos chefões do crime organizado no Brasil.
Mas a gente pode avançar até um pouco mais: se o irmão de Fernandinho Beira-Mar movimentar dinheiro criminoso, vamos convir: por mais detestável que seja, a grana não saiu dos cofres públicos, né? Se um político, no entanto, se esconde atrás de um parente para ocultar dinheiro, estejam certos: o cofre público foi assaltado.
De resto, o Estado brasileiro dispõe, se quiser, de instrumentos para acompanhar o caso hipotético do irmão de Fernandinho-Mar. Aliás, acompanhar a eventual movimentação de recursos do crime organizado é um dos trabalhos regulares da Polícia.
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