Não dá!
O Brasil vive uma situação delicada demais para que homens públicos que concentram tão graves responsabilidades errem tanto. E têm errado em proporções desmesuradas o presidente do país, o presidente da Câmara e o Procurador-Geral da República. Parece que todos resolveram se unir para levar o Brasil à beira do abismo. Não é isso, eu sei. Ninguém faria tal coisa de modo deliberado. Mas, para a população, num primeiro momento, importam mais os efeitos do que as causas.
Começarei a falar com Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, porque, afinal, ele está diretamente envolvido com o tema de mais fácil combustão. A chamada “anistia ao caixa dois” é, em tudo, um equívoco, já desde o apelido que lhe pespegaram Ministério Público Federal e imprensa. Não se anistia o que crime não é, observei aqui de primeira hora, já faz muitos dias. Logo, se anistia houvesse, seria a outros crimes. Ocorre que um projeto com esse conteúdo seria simplesmente inconstitucional.
O esforço de deputados anônimos de tentar encontrar uma brecha, QUE É INEXISTENTE, para se livrar de outras imputações — já que não poderão ser acusados de caixa dois porque, se aprovado o texto que o criminaliza, não pode haver retroação — está desmoralizando ainda mais o Congresso e armando a opinião pública contra o Poder Legislativo. E, sim!, para tanto, concorrem representantes do Ministério Público. Trato do caso quando me referir a Janot.
Maia tem de chegar nesta sexta e deixar claro: não se votará projeto nenhum que lembre qualquer coisa parecida com anistia. Tem de convocar os líderes para que estes se manifestem em nome de seus respectivos partidos. Ainda que a eventual aprovação de um projeto assim fosse inócua, isso não pode acontecer por uma questão moral. Deputados, no entanto, são livres. Quem quiser assinar projeto com esse conteúdo, que o faça, que dê o nome, que dê a cara ao tapa.
Não é possível que uma proposta que nem viável é, que não tem efetividade nenhuma, jogue o Parlamento numa das maiores crises de sua história.
Michel Temer
É evidente que o sr. Geddel Vieira Lima não pode permanecer no cargo. A nota emitida pela Presidência da República na noite de ontem é constrangedora. Pouco importa a intenção do presidente ao sugerir que a questão do prédio de interesse do ministro fosse passada para a AGU, o fato é que se sugeriu um trâmite que não era regular. Eventuais gravações evidenciando o que seria uma pressão imprópria do presidente e de ministros sobre Marcelo Calero elevam a crise a uma temperatura perigosa.
A nota da Presidência admite que se fez a gestão e tenta lhe emprestar regularidade. Mas todos reconhecem a delicadeza do que ali está. É praticamente impossível que uma denúncia com vistas ao impeachment prosperasse porque não passaria na Câmara, mas o conjunto fragiliza o presidente, e um chefe do Executivo fragilizado, vimos isso com Dilma, não consegue fazer o que tem de ser feito.
Quando me lembro da previsão de recessão de 3,5% neste ano e de crescimento de apenas 1% no ano que vem; quando me lembro de 12 milhões de desempregados; quando penso nas dificuldades adicionais que advirão do corte de gastos, penso que este governo tem pela frente, como tarefa, fazer, por exemplo, a reforma da Previdência e a reforma trabalhista.
Nesse ambiente, vai ser difícil. E nós sabemos: ou se fazem as reformas ou o país entra numa espiral negativa de efeitos imprevisíveis.
Rodrigo Janot
O procurador-geral da República pode ter começado a se assustar com o adensar das nuvens. Nesta quinta, parecia um pouco mais ponderado. Ele precisa recolher seus extremistas. Deltan Dallagnol tem direito a uma opinião, mas não pode se comportar como bedel de parlamentares ou como se fosse um policial do Congresso. Carlos Fernando, outro procurador, fala um despropósito quando afirma que chegou a hora de usar luvas de boxe para lutar contra o Legislativo. Trata-se de provocação barata.
Não é possível que essa retórica avance numa escalada sem fim. O pior é que Janot e os seus bravos conhecem as leis e sabem que não se pode chamar de anistia a impossibilidade de a lei penal retroagir para punir. Todos ali são versados em Constituição e têm consciência de que essa impossibilidade é um mandamento da Carta. Também estão devidamente informados de que não há caminho legal para anistiar outros crimes sob o pretexto de se anistiar o caixa dois.
É patente que membros de destaque do Ministério Público Federal reivindicam hoje a tutela da atividade legislativa. Mas não só: também pedem a tutela da atividade executiva. E não é raro que façam juízos muito pouco lisonjeiros de decisões tomadas no Supremo — o que indica a sua aspiração à onipotência.
Tome-se o caso do projeto que muda a lei de combate ao abuso de autoridade. Pespegou-se no texto a pecha de “anti-Lava-jato”, o que é de uma mentira fabulosa.
Chega!
Esses três senhores têm de atuar para baixar a temperatura da crise. E tem de ser agora, não depois.
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