Já deixei claro aqui, mais de uma vez, que acho satisfatório e correto o texto do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator da comissão especial que avaliou o projeto de lei de iniciativa de popular — na verdade, de autoria do Ministério Público — que trazia as tais 10 medidas contra a corrupção. As dez se transformaram, como se sabe, em 18 e depois em 17. Como os arquivos demonstram à farta, eu, a Constituição e o bom senso nos apúnhamos a 3 das 10 propostas originais, a saber: admissão em juízo de provas ilegais, restrições descabidas ao habeas corpus e teste de honestidade aplicado aleatoriamente. As duas primeiras sumiram do relatório de Lorenzoni, e a terceira perdeu seu caráter de persecução penal. Para mim, está bem assim. Logo, acho que o texto tem de ser aprovado.
E qual tem sido o obstáculo? O principal é uma tolice sem tamanho e atende pelo nome de “anistia ao caixa dois”. Essa questão é de tal sorte absurda que custa a crer que tenhamos de discuti-la.
O MPF só propôs a criminalização do caixa dois — o que é correto — porque reconhece que tal prática crime não era. Estava entre as condutas reprováveis, mas atípicas, sem uma lei que provocasse a persecução penal. Muito bem. O texto de Lorenzoni pune com pena de dois a cinco anos ou de quatro a dez tal prática: no primeiro caso, para recursos de origem lícita; no segundo, para os de origem ilícita.
Não depende de um procurador fazer ou não a lei retroagir. O inciso XL do Artigo 5º da Constituição é claríssimo: “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Assim, o projeto de Lorenzoni não precisa de nenhuma salvaguarda nesse sentido. Não será preciso ter, vamos dizer, medo do que fará a Lava Jato nesse particular. O Artigo 5º da Constituição, segundo o Artigo 60, é uma cláusula pétrea e não pode ser mudado nem por emenda constitucional.
Há deputados, no entanto, que gostariam de deixar claro em lei que o caixa dois, pois, cometido até 2016 não poderá ensejar a denúncia de nenhum outro crime, como, sei lá, corrupção ativa ou passiva ou lavagem de dinheiro. Eis um outro debate imbecil. O caixa dois cometido até a aprovação da nova lei continuará como conduta atípica; se, no entanto, o dinheiro for oriundo de propina, haverá a caracterização da corrupção ativa ou passiva, a depender do lado do balcão em que se esteja. Não há como se precaver. Logo, esse debate do caixa dois, como pode atestar qualquer um que entenda minimamente do riscado, é de uma ociosidade escandalosa.
Ainda que Lorenzoni acrescentasse a seu texto algo como “estão livres da persecução penal, prevista nesta lei, todos aqueles que receberam ou doaram recursos pelo caixa dois até a data da promulgação desta”, o efeito seria nenhum. Pela simples e óbvia razão de que não pode ser diferente.
“Mas e acrescentar que os que fizeram caixa dois não poderão ser acusados de corrupção…?” Ora, isso é simplesmente impossível. Ainda que se aprovasse uma aberração dessa natureza, o texto não passaria pelo crivo do Supremo. Porque não se trataria de anistiar o caixa dois, mas de anistiar a corrupção passiva ou ativa. Nunca vi debate tão imbecil. Ademais, como falar em anistiar o caixa dois se caixa dois, até agora, nem crime é? Como anistiar o que a lei não considera crime?
Lembro: o advogado Arnaldo Malheiros Filho, que morreu em 2016, tentou emplacar essa tese no caso do mensalão: seria tudo caixa dois. A paternidade da ideia foi atribuída, erroneamente, a Márcio Thomaz Bastos. Não deu certo. Houve condenações em penca por corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, peculato, o diabo a quatro…
Outro ponto
O outro ponto da proposta de Lorenzoni que está travando a tramitação é a possibilidade de juízes e promotores serem acusados de crime de responsabilidade. Ainda que eu não veja aberração nenhuma nisso, o tema é inoportuno num conjunto de leis contra a corrupção. Os que estão insistindo nessas questões estão emperrado o avanço do projeto em razão de irrelevâncias e comprometendo um tantinho mais a já conspurcada reputação do Poder Legislativo.
Senhores deputados da comissão, deixem de onda e aprovem logo o bom texto de Onyx Lorenzoni. Reitero: esse debate do caixa dois versa sobe o nada, e a possibilidade de acusar juízes e promotores de crime de responsabilidade não pode se transformar numa birra.
Esse troço tem de caminhar. Chega de papo-furado.
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