O senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB, concedeu uma entrevista ao Estado e disse não enxergar ameaças à Lava-Jato. Bem, eu também não enxergo. Não creio que possa estar ameaçada uma operação que meteu na cadeia alguns pesos pesados da economia; que lê, com espírito livre, e Sérgio Moro sabe que falo a verdade, o Artigo 312 do Código de Processo Penal; que consegue levar à prisão um senador (agora cassado), um ex-governador e um ex-presidente da Câmara…
Não pode estar sob ameaça um grupo que consegue abrir 11 inquéritos contra o presidente do Senado. Que vê seus bravos rapazes se transformando em legisladores… Que negocia acordos de delação premiada com uma ausência de regras de fazer inveja ao Tirano de Siracusa. Vejam, a propósito, o caso de Sérgio Machado. Se é para falar de anistia, convenham: este, sim, conseguiu anistiar toda a família, negociar a sua prisão numa gaiola de ouro e contar ainda com um padre para zelar por sua alma.
Onde está a ameaça?
“Ah, Reinaldo, a ameaça está no projeto de lei que pune abuso de autoridade”. Desculpem ser tão sintético: É MENTIRA! A íntegra do texto está aqui. Já propus que Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, os demais procuradores e Rodrigo Janot digam que trecho do texto ameaça a Lava Jato. Nenhum deles respondeu. O juiz conseguiu dizer, no máximo, que agora não é hora de votar uma lei como essa. Bem, dizer que existe uma hora para combater o abuso de autoridade é o mesmo que afirmar que existe uma hora para cometer abuso de autoridade. Lógica elementar.
“Ah, Reinaldo, a ameaça está na proposta de anistiar o caixa dois”. É mesmo? O MP só propôs o a criminalização do caixa dois porque não era… crime exatamente, mas conduta irregular atípica. Passará a ser. Lei penal não retroage. Chamar isso de anistia é bobagem. Tanto quanto é uma impossibilidade técnica garantir anistia a outros crimes. Logo, não é ameaça nenhuma.
“Ah, Reinaldo, estão querendo que os acordos de leniência impeçam que as pessoas envolvidas em falcatruas respondam pelos demais crimes”. Trata-se de uma referência ao projeto de lei 3636. É claro que não concordaria com um troço como esse. Acho, sim, necessário que as empresas façam acordos com a devida celeridade e paguem as respectivas multas para que voltem a operar normalmente. Ou milhares de trabalhadores pagarão com seus empregos. E que os demais crimes continuem a ser apurados, e os responsáveis, punidos.
Vamos ser claros? Um texto com tal conteúdo não passava de uma conjectura. Ainda que fosse aprovado, não feriria de morte a Lava Jato, como disseram os procuradores. Mas isso não será aprovado. Feitos os acordos de leniência, e haverá a participação de TCU e MPF, os responsáveis continuarão a responder cível e criminalmente por seus atos.
“Ah, Reinaldo, parlamentares querem que promotores e juízes possam ser acusados de crimes de responsabilidade; querem isso no relatório de Onyx Lorenzoni”. É verdade! Repito duas coisas que já disse aqui: a) se acontecesse, isso em nada feriria a autonomia das duas categorias; b) eu não incluiria isso no texto justamente para evitar essa gritaria histérica.
Mas acrescento um novo elemento: não convém que procuradores se comportem como legisladores e como policiais do Congresso. Mais ainda: quando membros do MPF dão entrevistas e dizem que só podem contar com o povo na rua para combater a corrupção, aí estão fazendo política. Acho que deveriam dizer outra coisa: SÓ CONTAMOS COM A CONSTITUIÇÃO. O que lhes parece?
Não! Não vejo uma Lava Jato ameaçada por uma anistia ao caixa dois que nem mesmo existe. Não vejo a Lava Jato, que é de 2014, ameaçada por um projeto que pune abuso de autoridade que é de… 2009. Não vejo a Lava Jato ameaçada pelo PL 3636 porque já está claro que leniência não implicará impunidade — e o MPF terá assento nas negociações, embora a lei a tanto não obrigue. E os procuradores sabem disso. Não vejo a Lava Jato ameaçada pelo texto de Onyx Lorenzoni ainda que voltasse a abrigar a possibilidade de juízes e procuradores serem acusados de crime de responsabilidade. Mas tudo indica que isso não estará lá.
Ameaça a conquistas democráticas haveria, isto sim, se as dez medidas passassem na sua forma original, com limitação de habeas corpus, admissão de provas ilegais, teste de honestidade com consequências penais e ampliação absurda das possibilidades de prisão preventiva. Isso tudo estava no projeto original do MP, que combati aqui desde o primeiro dia, tomando porrada de todo lado, é claro! Bem, eu estava certo. Ninguém mais defende essas barbaridades. Até os bravos do MPF perceberam que foram além da conta.
O Brasil segue sendo uma democracia. Não há ameaça nenhuma à Lava Jato. Ao contrário. A operação nunca esteve tão forte. A menos que alguns fanáticos agora queiram que a gente reze ao menos cinco vezes por dia voltados para Curitiba…
Não vai rolar
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