“Devo registrar uma preocupação: acabei de verificar um número imenso de abstenções, votos em branco e nulos , o que revela o que ouso dizer ‘a indispensável necessidade’ de uma reforma política do país, algo que penso que o Congresso Nacional deva cuidar com muita propriedade.”
A fala acima é do presidente Michel Temer ao chegar ao Paraguai nesta segunda para sua primeira visita bilateral. Está acompanhado dos ministros José Serra (Relações Exteriores), Raul Jungmann (Defesa), Alexandre de Moraes (Justiça) e Marcos Pereira (Desenvolvimento, Indústria e Comércio). Parlamentares também acompanharam a comitiva da viagem, que começou pela Argentina. O presidente já está de volta.
Vamos lá. Eu sempre tenho receio quando se fala em reforma política sem que se diga o que se quer. Temo ou pelo amor ao perfunctório ou pelas atitudes desastradas. A barbaridade da proibição da doação de empresas a campanhas decorre, de fato, uma decisão do Supremo, mas é bom lembrar que a ideia prosperou, sim, no Congresso à esteira do moralismo burro que alguns tentaram colar à lava-jato. Esse moralismo boçal é sempre o túmulo da moral. Faz muito barulho e não serve pra nada. Obtém sempre resultados contrários àquilo que diz pretender.
Muito bem! As abstenções, votos nulos e votos brancos, quando somados, apontam para um número elevado, sim. Eu quero fazer reforma política, já disse. Acho que é preciso implementar o parlamentarismo com voto distrital. Mas eu quero mais: também reivindico o voto facultativo. Se votar é um direito que tenho, não posso ser punido se não exercê-lo. Isso é uma estupidez. O voto obrigatório numa sociedade democrática é uma excrescência.
Por que digo isso? A abstenção nunca foi tão alta? Pois é…Não obstante, o país nunca foi tão democrático. Como é que ficamos, então? Eu quero fazer uma reforma política, sim, mas não é para levar nem mais nem menos pessoas paras as urnas. Eu a defendo porque considero que o parlamentarismo com voto distrital cria melhores condições de o cidadão vigiar o poder e porque o modelo pode nos proteger contra crises. Ou melhor: um governo inepto ou ladravaz pode cair sem ameaça de crise institucional.
No tempo da ditadura, os eleitores compareciam quase religiosamente para votar — menos para prefeitos de capitais, governadores e presidente —, e, no entanto, por óbvio, a democracia não vivia crise nenhuma porque democracia não havia. Acho que Temer falou aquilo que sabia que queriam ouvir. Imaginem se ele diz: “Ah, esse negócio de abstenção não tem a menor importância”.
Então ficamos assim: a reforma política é, sim, importantíssima, mas não porque o poder enfrenta uma crise inédita de legitimidade como se diz por aí. Precisamos mudar porque o que temos é ineficiente. E eu insisto que uma reforma decente tem de contemplar o voto facultativo. E a abstenção será certamente maior do que hoje.
O digníssimo cidadão tem o direito de não querer participar da escolha desde que não reivindique o direito de desrespeitar a lei.
Simples.
O resto é papo de direitista autoritário, de esquerdista autoritário e de otário autoritário, uma categoria crescente e barulhenta.
Presidente Temer, tome a iniciativa de reunir os líderes políticos para tratar do parlamentarismo. Não seja apenas mais um cronista nesse debate. Já os temos em excesso.
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