Em todos os lugares — e também na Wikipédia, acabei de constatar —, se faz um resumo bastante insuficiente da vida do senador romano Catilina, apresentando só como um pilantra que tentou derrubar a República por motivos pessoais.
“Catilinárias” é o nome que recebeu a série de quatro discursos que o também senador Cícero proferiu contra Catilina no ano de 63 a.C.
Mas Catilina era um pouco mais do que um patrício arruinado que punha em risco a República para cuidar apenas de seus interesses. Ao escolher esse nome para a nova fase da operação, é evidente que a Lava Jato deixa claro que o alvo principal é Eduardo Cunha. Da mesma sorte, há aí uma apreciação crítica do trabalho do deputado.
Sabem o que está profundamente errado aí? Eduardo Cunha está mais para Cícero do que para Catilina. Refiro-me, no caso, ao padrão ideológico.
Cícero era um conservador brilhante e um inimigo, para colocar em termos contemporâneos, de populistas à moda Catilina, que vivia vociferando contra os ricos, contra, ora vejam, a “Dona Zelite”. E que partiu para a luta armada.
Não por acaso, o brilhante orador se opôs também a César. Se não participou do complô para matá-lo, parece que não, ajudou a criar o clima. E chegou a escrever que gostaria, sim, de ter participado.
Cícero sabia que as circunstâncias conspiravam em favor do fim da República, antevê o seu declínio, luta contra o inexorável e perde a vida por isso. Seu confronto com Marco Antônio custou-lhe a vida.
Cabeça e mãos foram cortadas: o órgão que tramava e os que escreviam.
Só para registro: ainda que em dimensões estupidamente menores, sabem quem está mais para Catilina na política brasileira? Não é Eduardo Cunha, não, mas Guilherme Boulos: pertence à elite, usa causa pública em benefício de seus interesses (ainda que sejam os ideológicos), faz discurso rancoroso contra as elites, mobiliza seu próprio exército e adota práticas que o Código Penal define como criminosas.
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