A presidente Dilma Rousseff fez um discurso há pouco sobre a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que anunciou que vai acolher a denúncia que pode resultar no seu impeachment. É evidente que, para não variar, Dilma cometeu um erro — mais um. Além de faltar com a verdade de forma escandalosa. E, convenham, há momentos em que só a verdade pega bem.
Dilma fez uma menção à mudança da meta fiscal aprovada pelo Congresso e, em seguida, partiu pra cima de Cunha. Mais atacou o outro do que tratou dos motivos que estão na raiz da denúncia. E, nesse caso, não contou novidade nenhuma.
Mas comecemos pela inverdade grotesca. Como todo mundo sabe, Cunha deixou claro que esperava contar com os três votos do PT no Conselho de Ética, o que impediria de a denúncia contra ele avançar.
O Planalto participou da negociação para obter esses votos até a tarde desta quarta. Então, não é verdade que esse é um governo que não aceitaria “barganha”. Jaques Wagner tentou. Ricardo Berzoini tentou. Lula tentou. Mas o PT decidiu pagar pra ver.
Deputados da sigla e Rui Falcão fizeram pressão para que os três petistas do conselho votassem contra Cunha, posição que acabou prevalecendo. Assim, é claro que o partido resolveu cuidar do seu interesse e mandou Dilma plantar batatas.
Agora vamos à fala da governanta, que teve o propósito de se apresentar como vítima de Cunha. Com uma sutileza que não pedia grandes voos interpretativos, disse a mandatária que as acusações contra ela são “improcedentes” e “inconsistentes”. E aí foi desfilando tudo o que nunca fez, deixando claro que se referia, por contraste, à biografia de Cunha.
Escreveu, como um Machado de Assis menos oblíquo, o seu capítulo das negativas. Afirmou:
– “Não possuo conta no exterior”;
– “Não escondi bens”;
– “Nunca coagi ninguém”;
– “Nunca questionaram a minha idoneidade”;
– “Jamais aceitaria um barganha”.
Qual é o problema? Digamos que ela não tenha feito nada disso e que ele tenha feito tudo isso. Ocorre que não são essas as acusações que pesam contra ela na denúncia que foi aceita (íntegra aqui). Com efeito, essas são as denúncias que pesam contra ele, pelas quais ele terá de responder na Câmara e no Supremo.
O modo de Dilma responder é estranho à lógica, além de inoportuno. No fim das contas, ela diz: “Eu não sou acusada dos crimes de que o acusam”. De fato. Mas e daí?
Na denúncia contra Dilma, há as pedaladas dadas — e já admitidas — em 2014, mas também as praticadas em 2015. Não só isso.
A peça evidencia ainda que ela editou uma série de decretos em 2014 e 2015, já neste mandato, que resultaram na abertura de créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional, crime devidamente tipificado nos itens 4 e 6 do Artigo 10 da Lei 1.079, a chamada Lei do Impeachment.
O texto aponta, sim, os descalabros da Petrobras e acusa a responsabilidade da presidente, evocando os itens 3 e 7 do Artigo 9º da mesma Lei 1.079, segundo os quais “são crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição; (…) proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.
Tudo indica que Eduardo Cunha — e espero que assim seja — vá pagar, sim, também na Câmara, pelos crimes que cometeu — no Supremo, não há a menor dúvida. Ora, que Dilma arque com o peso dos seus, cada um segundo a sua responsabilidade.
Reitero: ainda que prevaleça a leitura ridícula, absurda, que se faz do Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição — a saber: “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções —, a denúncia contra a presidente deixa claro que ela pedalou e editou decretos ilegais também em 2015.
E por que falo em “leitura ridícula”? Porque é obvio que não se podem considerar as pedaladas de 2014 “estranhas” ao mandato atual já que foram dadas justamente para que Dilma escondesse do distinto público a situação fiscal miserável do Brasil, o que lhe permitiu fazer uma campanha eleitoral mentirosa, omissa, que colaborou para que obtivesse o segundo mandato.
Mais: ao manter os programas oficiais com dinheiro que não pertencia ao Tesouro, mas aos bancos públicos, estava usando as ilegalidades para cuidar de seu patrimônio eleitoral.
Dilma escolheu ser vítima em sua fala. OK. É uma tática. Só que o Brasil está a precisar de uma líder ou um de líder que respeite as regras do jogo, não de uma mártir desastrada, vítima de sua própria concepção de mundo.
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