Que coisa, não é? Chega a ser pateticamente comovente a gritaria promovida agora contra a eventual aprovação do fundo público de campanha e do voto em lista fechada. É claro que sou contra as duas coisas. Mas não sou nem demagogo nem nefelibata. Vale dizer: não ando nas nuvens nem divulgo ideias que sei erradas para pessoas que sei idiotas (como sintetizou Mencken), prática que hoje tão bem caracteriza as redes sociais. Há exceções? Bem, até no inferno deve haver. Por que não nas ditas-cujas?
Por realista, constato que tudo indica que, para a eleição de 2018, não sobrou alternativa que não o financiamento público (eventualmente com recursos doados pelo setor privado a um fundo) e voto em lista fechada. Terá de ser fechada se assim for o financiamento porque os candidatos não poderão fazer competição entre si. A campanha é do partido. Eu quero, meus queridos, é pensar no futuro. Meus olhos se voltam, então, para 2022. Mas, antes, algumas considerações.
Silêncio vergonhoso
Em 2011, as duas coisas estavam na proposta de reforma política do PT. Quem, na grande imprensa, batia na tese e chamava a estrovenga de autoritária? Ah, o tal Reinaldo Azevedo, o que “pensa que pode opinar sobre qualquer assunto”. Pois é… Só que eu tratava de legislação e questão técnica, sem medo de tomar porrada. E defendia o financiamento privado de campanha.
E continuei a defendê-lo quando, em 2014, pegou fogo o debate sobre a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) em votação no Supremo, que havia iniciado em dezembro de 2013. Quatro ministros, então, declararam, o que me parece absurdo, a inconstitucionalidade da doação privada: Luiz Fux (relator), Joaquim Barbosa, Dias Tofffoli e Luís Roberto Barroso. Quando o tema foi retomado, em abril de 2014, outros dois formaram já a maioria: Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski. Gilmar Mendes pediu, então, vista.a |
E passou a ser pressionado cotidianamente, inclusive pela imprensa, a entregar logo seu voto. O tema foi retomado em 2015. Mendes disse o que me parece ser o óbvio: a Constituição não veda (e não veda) a doação privada. E o melhor seria o Supremo, como queria Teori Zavascki (um dos três votos divergentes), tomar uma decisão modulada, que restringisse a largueza com que se podiam fazer doações privadas, mas sem proibi-las.
Não adiantou. Aquele era o espírito dos movimentos de redes. Rodrigo Janot, procurador-geral da República, mandou bala: dinheiro de empresas em eleições fere a Constituição!
E eu? Bem, fiquei praticamente sozinho na defesa do financiamento privado, com os canalhas indagando qual seria o meu interesse na coisa… O meu interesse? Uma lógica que chega a ser pedestre, mas verdadeira: se o financiamento não for privado, será público. Ou o grosso da grana sai das empresas ou sai do Orçamento. Manter a lei em vigência corresponde a entregar as disputas presidencial e legislativa ao crime organizado, a exemplo do que aconteceu com as eleições municipais.
Caramba! Mas o que querem os que agora gritam? Não têm e não tiveram a coragem de defender o financiamento privado e ora se opõem, como crianças birrentas, também ao público? Acham que podem demonizar a política, os políticos, as empresas doadoras, esperando depois contar com a sua colaboração?
Ainda que o financiamento privado volte, por um bom tempo, as empresas não vão querer nem ouvir falar. As empreiteiras devem se manter distantes. Os bancos tomarão um cuidado danado. Já escrevi aqui: se o sujeito que declara oficialmente a doação está, na prática, dando o primeiro passo para que seja investigado, quem vai querer se meter nesse rolo.
A eventual aprovação do financiamento público, com lista fechada, é uma vitória das esquerdas, do Ministério Público Federal, de Rodrigo Janot, da Lava Jato e, reconheça-se, de Roberto Barroso, o mais esquerdista dos membros da corte. Ele advogou em favor da causa, para a OAB, quando ainda não era ministro. O texto da ADI que chegou ao tribunal era, na verdade, de sua autoria. Mesmo assim ele não se declarou impedido de votar. Votou e ainda fez proselitismo.
Não pergunte muito quem é o responsável por isso. Corre o risco de ser também você.
O futuro
Sinceramente, não tenho muitas esperanças sobre o formato da eleição de 2018. Mesmo que o financiamento privado volte, acho que boa parte das empresas vai preferir se manter longe da coisa. Se for público, o voto em lista — o famigerado — é um desdobramento natural.
Então quero salvar 2022. E faço aqui uma sugestão: que se elabore um texto reabilitando o financiamento privado e que, então, se introduza no país o voto distrital puro.. “Ah, o puro não passa…” Dá para pensar no misto. O que não pode é a coisa continuar como está.
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