Leiam trecho do brilhante artigo de Tiago Pavinatto na página “Estado da Arte”, do Estadão. O autor é a evidência de que juventude não é desculpa para a ignorância e a burrice.
*
Há 160 anos, o farmacêutico suíço Jean Neuhaus instalou-se em Bruxelas e abriu seu negócio na prestigiada Galerie de la Reine. Neuhaus oferecia a seus clientes refinados artigos de confeitaria combinando dois produtos de uma maneira nunca antes pensada na história daquele mundo às vésperas da Belle Époque: escondia a amargura dos remédios envolvendo-os em uma camada de delicioso chocolate… e a paixão pelo chocolate absorvia-o mais e mais, tendo sido transmitida aos seus descendentes que acabaram por transformar o sobrenome na marca do ainda melhor chocolate do mundo e também da Bélgica.
Naquele mesmo ano de 1857, no Estado brasileiro do Rio Grande do Sul, era fundado o Município de Passo Fundo.
Ora, direis que ouvimos estrelas e, certo, perdemos o senso. Mas vos diremos, no entanto, tratar-se de uma inacreditável coincidência o fato de estarmos além-mar a comprar caixas do tradicional praline belga e recebermos “vazamento” com a degravação da interceptação telefônica de Salomé Maria da Anunciação, a mais célebre cidadã de Passo Fundo, que, desde os anos finais do Regime Militar, sentada à frente de seu telefone, tem enorme influência na República (no que apenas fica atrás de José Ribamar, o de vida eterna).
Assim, em primeira mão, divulgamos, sem cortes, o conteúdo do grampo da ligação de Salomé para Luís Roberto, cujo sobrenome não foi mencionado.
Salomé: Alô, Luís Roberto, é Salomé de Passo Fundo.
Luís Roberto: Po… (é prontamente interrompido).
Salomé: Não fales nada, Luís Roberto. Tu falas demais. Quem vai falar, aqui, sou eu. E não reclames, porque tenho idade pra ser a tua bisavó. Não fales, porque eu ainda desconfio que tenha uma escuta no meu fixo, Luís Roberto, e estou certa que foi um certo mouro que fez essa barbaridade.
Luís Roberto: Mou… (é cortado mais uma vez).
Salomé: Mouro, sim, Luís Roberto. Esqueceste que sou professora? Aposentada, mas ainda professora. Mouro é um “homem que trabalha muito”, veja lá naquele dicionário moderno do Afonso Telles Alves… está lá. Não se trata de intolerância religiosa. Barbaridade pensares isso, Luís Roberto!
Agora, é engraçado, Luís Roberto, que eu não possa nem me manifestar publicamente contra esse mouro. Nem eu nem ninguém. Vão logo dizer de minha proximidade com o João Baptista… como se eu fosse uma entusiasta da repressão! Logo eu, Luís Roberto! Barbaridade! Logo eu que fiz a cabeça do João Baptista; que abri a cabeça dele pra abertura… e ele até me prometeu que prendia e arrebentava quem fosse contra.
De um lado, Luís Roberto, uma piazada iria me chamar de golpista. Do outro, iriam me chamar de petista – Deus me livre e guarde! – … e a piazada desta hipótese, vejas que barbaridade, Luís Roberto, declara voto num tal de Jair, que não perde a oportunidade de homenagear o pessoal do João Baptista.
Eu não sou o Ney Matogrosso e nunca vi rastro de cobra, nem couro de lobisomem. Mas a situação é esta: se correr, o bicho pega e, se ficar, o bicho come. Barbaridade, tchê!
E tu tens culpa nisso tudo, Luís Roberto. Tu ficas dando corda pra esse mouro. Tu ages igual a ele. Que história é essa de tomar decisão moralizadora e contra a Constituição, Luís Roberto? Que barbaridade!
Eu li na revista, Luís Roberto. Tu disseste que a decisão do financiamento eleitoral privado “foi uma decisão moralizadora”. Reconheceste que a proibição deveria partir do Congresso, mas vieste falar de moral?
Tu queres moralizar o país e colocar cigarrinho do capeta na boca da piazada, Luís Roberto?
(…)
Íntegra aqui
Arquivado em:Brasil, Política
from Reinaldo Azevedo – VEJA.com http://ift.tt/2pPJ6ZV
via IFTTT
Nenhum comentário:
Postar um comentário