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terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Trump, a direita kitsch, ou muda ou não vai até o fim

Donald Trump já cumpriu uma de suas promessas de campanha. Tirou os EUA da chamada Parceria Transpacífico (TPP), um acordo comercial que, se chegasse a ser efetivado, seria o maior da história: 42% do PIB mundial. Depois de sete anos de negociação, chegou-se a um formato em 2015. Além dos EUA, integram o TPP Canadá, Singapura,  Brunei, Japão, Vietnã, Malásia, Austrália, Nova Zelândia, Chile, México e Peru. Nada muda de imediato na ordem das coisas. O acordo ainda não estava em prática. Ah, sim: no mesmo dia, Trump assinou duas outras ordens executivas: uma sobre aborto e outra sobre lobby. Ele é bom de marketing. Vamos ver.

Mais do que um eventual prejuízo efetivo, o que conta é o sinal emitido por Trump. Sim, é verdade, Hillary Clinton, cedendo a pressões dos sindicatos, também havia se comprometido a rever o TPP. Então que fique claro desde já: esquerda e direita dos EUA resolveram se unir, como é mesmo, “em defesa do emprego dos americanos”. Adivinhem quem poderia perfeitamente fazer esse discurso por aqui…

Setores da direita no Brasil não deixam de ter a sua graça. Quando o PT decidiu impor 70% de conteúdo nacional na construção das plataformas da Petrobras, fez-se uma grita danada contra a medida. E eu também gritei, ora essa! E, só para constar, a promessa não foi cumprida, e a medida foi usada para assaltar os cofres públicos. Por que faço essa lembrança? Ora, no que diz respeito à economia, um esquerdista convicto não emitiria opiniões muito distintas daquelas expressas por Trump. Com o decreto, nota-se que ele pretende dar consequência prática a seu discurso doidivanas. Ok: por enquanto, ele apenas revogou o que era ainda um acordo apalavrado.

Se o presidente americano conseguir pôr em prática o que prometeu em campanha, o planeta caminharia para uma polarização: os norte-americanos contra o resto do mundo. Por quê? Ora, os EUA ainda são a maior economia do planeta. Trump dá a entender que, em lugar de acordos multilaterais, ele vai procurar acordos bilaterais, que, anuncia pomposamente, têm de ser bons para os EUA. Ocorre que esse mundo do Sr. Trump não existe mais.

Será que, como resposta ao isolacionismo também econômico dos EUA, a China, por exemplo, vai se voltar para dentro, falando apenas aos seus, impondo na base do porrete acordos bilaterais? Quero crer que não! O mais provável é que se esforce para ocupar o espaço que os EUA estariam abandonando. Escrevo “estariam“ porque não aposto que Trump vá muito longe nessa política. Na verdade, não aposto que conclua o mandato.

Exotismo O que está em curso é de tal sorte exótico que é preciso, com efeito, jogar no lixo toda a lógica, todo o saber convencional e todo o bom senso para se entusiasmar com o bufão. Claro! Trump, como um fenômeno reativo, é plenamente explicável. De tal sorte a esquerda cultural americana, mais autoritária e violenta do que a nossa, se impôs ao cidadão comum que a muitos não restou saída a não ser caminhar para o outro extremo.

E Trump manipula isso muito bem. Tanto é que, no mesmo dia em que tirou os EUA do TPP, assinou uma ordem suspendendo a ajuda oficial a entidades que fazem a defesa do aborto — todo republicano faz isso… — e outra em que proíbe por cinco anos que ex-funcionários do governo atuem em grupos de lobby. O homem que promete fazer dos EUA uma economia fechada (!?) acena, assim, à direita tradicional, autóctone, caipira, localista… Alimenta, de quebra, o rancor contra os políticos.

Aí cabe a pergunta: faz sentido que o presidente do país que comandou o processo de globalização seja hoje o seu maior crítico, erguendo o dedo “contra eles”, os gloabalistas, mais ou menos como a Jandira Feghali poderia fazer no Brasil? A globalização tirou empregos dos americanos, como quer Trump, ou lhes gerou tal e tão espantoso excedente que foi possível financiar a revolução tecnológica? A globalização fez milhões de desempregados e deserdados ou reduziu a pobreza, mesmo em termos proporcionais, como nunca se viu no mundo em tão pouco tempo? E essa redução foi global, não apenas na China.

Entusiastas Temos entusiastas de Trump no Brasil. Aqui e ali, alguém diz: “Precisamos de um Trump brasileiro…” É mesmo? Quem será ele? A propósito, qual seria a versão verde-amarela do trumpismo, além, claro, do fascismo pedestre que consiste em ofender mulheres, gays, negros e minorias menos influentes? Quem é que, ao pensar economia, diz coisas mais parecidas com o presidente dos EUA? Respondo: o PT, o PCdoB, o PSOl, o PDT…

Até onde vai Trump no intuito de fazer a história andar para trás e pôr fim à globalização? E, claro, depois será preciso pensar a sua pregação isolacionista na geopolítica. Fica para outra hora.

Não acho que consiga concluir o mandato. A menos que seja neutralizado, tornando-se mera peça de decoração da direita kitsch.

 


Arquivado em:Blogs, Mundo, Política


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