Vamos lá.
Um governo não pode contar com réus na Esplanada de Ministérios. Não é um óbice legal, mas político. Se isso acontece, esse ministro (ou ministros) tem de ser exonerado.
Evidentemente, vou tratar aqui da situação de Moreira Franco, que já era ministro sem ser (aliás, um dos mais influentes), conduzido por Michel Temer à Secretaria Geral da Presidência. Passará a ter, como se sabe, o foro especial por prerrogativa de função. Só pode responder a ação penal perante o Supremo Tribunal Federal.
Em lugar de Temer, eu teria feito isso? Resposta: “Não!” E pelos motivos que se vê. A nomeação, no entanto, caracteriza alguma tentativa de obstrução da Justiça ou de interferência num processo — como, claramente, se deu com a de Lula para a Casa Civil? A resposta é “não”.
Bem, quem escreve aqui é o “Reinaldo de sempre”, o que pergunta o que diz a lei. Quem escreve aqui é o Reinaldo que achava e acha que Rodrigo Maia era — e é — o melhor para a Câmara no universo dado, mas que alertou para a ilegalidade da candidatura e para o exotismo da decisão de Celso de Mello.
No Estado de Direito, primeiro pergunto o que diz a lei. Na ditadura, a hierarquia é outra, embora eu repudie o vale tudo também nesse caso.
Dados tais pressupostos, aos fatos do dia. Retomo o fio conceitual em seguida.
O PT vai, é claro, fazer o que se espera que o PT faça em circunstâncias assim. O deputado Wadih Damous (PT-RJ), prepara uma representação a ser apresentada à Procuradoria-Geral da República contra a nomeação de Moreira. Para ele, essa minirreforma ministerial é muito grave: “Uma pasta para um multicitado na Lava Jato com o objetivo claro de conferir a ele foro privilegiado”. A ideia de Damous é protocolar o pedido na semana que vem. Moreira Franco foi citado na delação premiada do ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho.
Em um anexo, o ex-executivo afirmou que a empresa teria pagado R$ 3 milhões em propina para que ele cancelasse uma obra. Na época, em 2014, era ministro da Secretaria de Aviação Civil do governo de Dilma. A Lava Jato reuniu também mensagens trocadas em 2013 entre o ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques Azevedo e o atual secretário-geral do governo Temer. No diálogo, eles tratam da concessão do Aeroporto Internacional de Confins, em Minas Gerais, antes e depois do leilão, realizado em 22 de novembro.
Vamos ver
Quando Gilmar Mendes concedeu liminar contra a posse de Lula no ministério Dilma, o ex-presidente já era investigado em inquéritos; o próprio PT alardeava que algo precisaria ser feito, ou Sérgio Moro decretaria a prisão preventiva de Lula. Gravações de conversas da cúpula do petismo, incluindo a então presidente Dilma, evidenciavam que se queria usar a nomeação — um ato de Estado — para interferir no curso do processo, para retirá-lo da 13ª Vara e enviá-lo ao Supremo. Ora, eis aí, de maneira insofismável, um ato de obstrução.
Mas é o caso de Moreira? Vamos ver.
– réu ele não é (nem Lula era);
– não foi indiciado; não é investigado em inquérito;
– não há obstrução de processo porque inexiste processo.
O que quer este impressionante sr. Damous, que envergonha a OAB-RJ retroativamente — ele já presidiu a entidade. Quer que alguém seja impedido de assumir um ministério com base em vazamentos ilegais de delação?
Bem, acho que nem a retórica sempre complexa de Marco Aurélio ou os triplos saltos carpados retóricos de Roberto Barroso conseguiriam justificar essa.
De resto, note-se: uma vez ministro, o limite da atuação do Supremo no caso de Moreira, se a coisa avançar, será a aceitação ou rejeição da denúncia. Se aceita, ele terá de deixar o governo, perde o foro especial e vai para a primeira instância.
Acho que se faz muito barulho por nada.
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