Ah, mas era batatolina, né? A reação dos cinquenta tons de vermelho à indicação certa de Alexandre de Moraes para o STF viria como a certeza com que o dia vem depois da noite, que antecede o dia. É uma mecânica ideológica que já se confunde com uma mecânica da natureza.
Sim, Moraes será indicado pelo presidente Michel Temer. Será, depois submetido à sabatina do Senado. Se aprovado, ocupará a vaga aberta com a morte de Teori Zavascki. Os leitores deste blog ficaram sabendo primeiro, certo. Boa a escolha de vocês, rsrs. Mas vamos lá.
Na minha coluna de sexta, na Folha, afirmei que dois eram os meus candidatos pessoais: Ives Gandra Martins Filho e Alexandre de Moraes, destacando que, na minha fila pessoal, o atual ministro da Justiça estava na frente. Os dois estão aptos a realizar o desígnio que considero necessário a um ministro da Justiça: CONSERVAR AS INSTITUIÇÕES DO ESTADO DE DIREITO, A CONSTITUIÇÃO E AS LEIS\. ATÉ QUE SEJAM MUDADAS PELO CONGRESSO. No post desta madrugada, evidencio por que, no momento, Moraes é preferível a Ives: experiência no trato com segurança pública.
Pausa para Ives
Acho que Ives foi alvo de indignidades assombrosas. Não aprovo a metáfora a que recorreu para evidenciar que a união civil homossexual não é um direito que vem da natureza, mas um arranjo organizado pela sociedade, com base, obviamente, num dado da natureza. Muito bem: o hoje presidente do Tribunal Superior do Trabalho quis apenas ressaltar, com associação infeliz de ideias, que nada há de natural a união de duas pessoas do mesmo sexo.
São escolhas feitas pela sociedade. Poderia ter escrito: a união civil entre dois homens e tão natural como a que fosse feita entre um homem e uma Barbie; entre a mulher e o Ken; entre o Ken e o Ken; entre a Barbie e a Barbie. Basta ler o texto direito para constatar que Ives não associava a homossexualidade a uma aberração. Ah, sim: ele também se opõe ao aborto. E os nossos ditos “progressistas” gostam é de ministro que chuta o traseiro do Congresso e tenta legalizar a prática na canetada. Também vê com reservar pesquisas com células-tronco embrionárias. Também vejo. Os marcos legais no Brasil são pobres a respeito. A moderna genética já pode desenvolver órgãos com genes humanos em porcos. E aí? Com ironia, digo que podemos viver uma era pós-orwelliana, não é? Porcos não substituirão humanos; serão humanos. Humanos talvez parem de se alimentar de porcos. Serão porcos.
Sem contar que comer um torresmo trará sempre a suspeita de canibalismo.
Recorro à ironia porque acho impressionante que ele tenha sido massacrado sem que tenham procurado ao menos entender a extensão das suas reservas nos três temas, dois deles com posicionamento já firmado pelo Supremo. Só o aborto ainda está exposto a perorações.
Ah, mas Ives não comunga da metafísica dos 50 tons de vermelho. Sem contar que, onde já se viu, pertencem à prelazia católica Opus Dei. Se nomearem um macumbeiro para o STF — e não me oponho, deixo claro! —, isso será saudado como aposta na diversidade. Mas é evidente que não se pode suportar um católico. Não custa lembrar: os 50 tons dos Camisas Negras também reagiram.
Volto a Moraes
Fuzilar Ives correspondia à primeira etapa de uma tarefa — não de natureza conspiratória. Não houve reunião para definir as etapas. E que tarefa era essa? Inviabilizar qualquer nome que não fosse identificado com a pauta das esquerdas, especialmente na área comportamento. Nos dias que correm, um feticida militante já reivindica no debate um lugar superior. Um defensor da liberação total das drogas, também. Mas quem lhes dá esse lugar privilegiado? Ora, os seus iguais, esquerdistas como eles próprios. E, como é sabido, os valentes dominam as redações a aparelhos culturais.
Muito bem! Agora usam a tese de Moraes para tentar desmoralizá-lo como como indicado. Ele defendeu há quase vinte anos que aquele que exerceu cargo de confiança não poderia ser indicado pelo Supremo. Também sugeriu mudanças na forma de compor o tribunal: parte viria do Congresso, parte da Presidência, e parte seria indicada pelo próprio tribunal.
Discordo das duas teses, mas pouco importa. O fato é que as coisas não são assim. Não foi essa a vontade do constituinte, ora bolas! Então Moraes deveria recusar a indicação — e isso na hipótese de que pense o mesmo hoje, o que gente não sabe. Eu me arrependo profundamente, por exemplo, de ter defendido o Presidencialismo no plebiscito de 1993.
Também há o esforço de liberado de macular sua vida acadêmica com firulas sobre critérios de bancas universitárias. Moraes é um constitucionalista respeitado mesmo por aqueles que não gostam dele. É autor de livros de referência na área.
Tortura
E as indignidades se seguem. Uma questão de caráter especulativo, lançada em sala como professor — e professores devem pensar com medida, sim, mas sem escrúpulo (já expliquei o sentido dessa frase, procurem) — agora serve para os que querem pespegar nele a pecha de defensor da tortura. É um nojo. Até porque eu mesmo já lancei aqui a dúvida que ele lançou em sala. Dou o meu próprio exemplo: se um serviço de segurança de uma democracia sólida tem em mãos um terrorista que sabe a hora e o local em que um carro-bomba matará centenas de pessoas, a tortura, ainda assim, é inaceitável? Sabem por que essa questão se volta contra Moraes? Porque as pessoas têm receio de ouvir a própria resposta. Na dúvida, leitor amigo, torne a coisa mais concreta: sabe-se que uma bomba explodirá numa escola infantil. Ao pensar, coloque seu filho dentro de uma escola infantil qualquer.
Ora, os governos europeus enfrentam hoje essa questão. Será que sabemos quantos atentados terroristas já se frustraram em razão de ações cujo nome queremos ignorar?
“Ah, então você também defende a tortura?” Não sejam ridículos! Nem Alexandre nem eu. Mas ninguém deve, em nome de princípios e de sua suposta profundidade intelectual e humanista, abster-se de pensar. A propósito: Donald Trump é um trouxa quando ameaça assinar uma ordem executiva permitindo a tortura. Nesse caso, tem de seguir Obama: proíbe a tortura, e deixa que a área de segurança trabalhe.
Começo a encerrar
Moraes tem todas as condições intelectuais e técnicas de ser um grande ministro do Supremo.
Ah, sim: curiosamente, a extrema direita babona também está descontente. Aí são restrições que parte do 50 tons dos Camisas Negras. São as vozes do fascismo caipira.
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