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quinta-feira, 31 de março de 2016

Quando um jovem de 20 anos dá aula de direito a um ministro do Supremo de 69

No dia 13 de novembro do ano passado, o ministro Marco Aurélio Mello conferiu uma palestra no Insper, sobre liberdade de expressão. Embora se soubesse, então, das entranhas do governo Dilma muito menos do que se sabe agora, afirmou o seguinte:
“Precisamos reconhecer, com desassombro, que hoje não há governo no Brasil. Não se conseguem tocar medidas econômica e financeiras indispensáveis à suplantação da crise mais séria, que é econômica e financeira. Precisamos deixar os interesses políticos paroquiais em segundo plano”.

No dia 30 de março de 2016, nesta quarta-feira, o mesmo Marco Aurélio afirmou o que segue sobre a possibilidade de Dilma recorrer ao Supremo contra um possível impeachment:
“Pode (recorrer). O Judiciário é a última trincheira da cidadania. E pode ter um questionamento para demonstrar que não há fato jurídico, muito embora haja fato político, suficiente ao impedimento. E não interessa, de início, ao Brasil apear esse ou aquele chefe do Executivo nacional ou estadual. Porque, a meu ver, isso gera até mesmo muita insegurança. O ideal seria o entendimento entre os dois Poderes, como preconizado pela Constituição Federal para combater-se a crise que afeta o trabalhador, a mesa do trabalhador, que é a crise econômico-financeira. Por que não se sentam à mesa para discutir as medidas indispensáveis nesse momento? Por que insistem em inviabilizar a governança pátria? Nós não sabemos”

O seu pior
Marco Aurélio produziu o seu pior. Quando um ministro veterano do Supremo recebe uma lição de um rapaz de 20 anos, primeiro-anista de Direito, isso nos diz duas coisas: 1) o jovem, muito provavelmente, tem uma inteligência acima da média; 2) o senhor maduro, não muito distante de se aposentar, certamente precisa voltar ao livro texto.

Refiro-me a Kim Kataguiri, um dos coordenadores do Movimento Brasil Livre. Ele concedeu nesta quarta uma entrevista a Heródoto Barbeiro, no Jornal da Record News. O vídeo segue abaixo. Convidado a comentar a fala de Marco Aurélio, ensinou o aluno àquele que deveria ser seu professor (entre 9min e 10min20s):

“Foi uma declaração muito mais política do que técnica, do que jurídica. A questão do impeachment vai muito além de você resolver a crise política ou a crise econômica. Também se trata de punir um presidente da República que cometeu crime de responsabilidade. Ele diz: ‘Bem, por que vocês não se sentam e fazem um acordão?’ Ele está defendendo a velha política. Não é isso o que a gente quer para o nosso país. Se a gente deixa um presidente da República cometer um crime de responsabilidade e cria esse precedente para que outros presidentes continuem a cometer esse crime, a gente enfraquece as instituições, a gente enfraquece a democracia. O que ele está defendendo ali, basicamente, é que, como a Dilma não tem voto no Congresso, ela parta para o tapetão; ela apele para a judicialização de uma questão que já tem embasamento jurídico e, ao mesmo tempo, tem o apoio do Congresso Nacional e tem legitimidade popular. Eu vejo isso com muita preocupação. Um ministro do Supremo não deve ter o papel de defesa política de um governo…”

Heródoto interrompe: “Outros ministros fazem a mesma coisa. Gilmar Mendes vive falando de política…”

Kim: “Ah, sim, falar de política é essencial. Não é essa a questão, não é esse o mérito. A questão é defender um partido político, sendo um ministro do Supremo Tribunal Federal, cuja função essencial é proteger a Constituição. Se a gente quer proteger a Constituição, a gente tem de punir presidentes que cometam crime de responsabilidade”.

Retomo
Submetam as duas falas a qualquer jurista isento para saber qual é técnica, ancorada no Estado de Direito, e qual é meramente politiqueira.

De resto, se Dilma for impichada e recorrer mesmo ao Supremo, espero que o doutor se declare impedido de votar por já tê-lo feito previamente, fora dos autos.

Não deixa de ser curiosa a fala do ministro. Mais de uma vez, ele já pontificou no Supremo que um juiz tem de se ater à Constituição e ponto. Independentemente do alarido.

Ele que espere a questão chegar ao tribunal e, se achar que não houve crime de responsabilidade, que invada mais uma vez a competência do Congresso, como passou a fazer amiúde de uns tempos pra cá.

Não é uma fala digna do ministro que aprendi a respeitar. E não porque ele certamente pensa o contrário do que penso sobre o impeachment. Mas porque é tecnicamente canhestra.



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