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terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Cunha pede ao STF suspensão de um dos inquéritos até que esteja na presidência da Câmara. Será que faz sentido?

Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, decidiu ir à luta. Os advogados que compõem a sua defesa, informa a Folha, pediram ao Supremo que paralise um dos inquéritos contra ele até, ao menos que o parlamentar deixe a Presidência da Casa. O mandato vai até fevereiro do ano que vem. A defesa pede mais: que não seja usada contra Cunha nenhuma prova coletada na Operação Catilinárias e que seja reconhecida a nulidade dos depoimentos complementares do lobista Júlio Camargo.

Para esclarecer: o inquérito em questão é o que apura o pagamento, pela empresa coreana Samsung Heavy Industries, de uma propina de US$ 5 milhões ao deputado para fornecimento de navios-sondas para a Petrobras.

Vamos ao que pode e ao que não pode dar samba. O pedido de suspensão até que Cunha conclua seu mandato me parece um despropósito. Ele é feito por analogia. Como o parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição estabelece que o presidente da República, “na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”, a defesa reivindica o mesmo para o presidente da Câmara, já que ele é o terceiro na linha sucessória. Ou por outra: enquanto ele ocupar a função, não poderia ser responsabilizado por qualquer coisa que tenha feito antes. Os pagamentos a Cunha teriam sido feitos em 2011, e ele assumiu a presidência da Câmara em 2015.

Não faz sentido. A Constituição é explicita: a restrição vale para o presidente da República. E, olhem lá, houvesse um mínimo de bom senso, deveria ser relativizada. Afinal, o dispositivo foi posto na Constituição antes de haver reeleição. Será que um presidente pode cometer crime para se reeleger — pedaladas fiscais, por exemplo — sem ser responsabilizado por isso? Será que foi isso o que quis dizer o Constituinte?

Não creio que Cunha vá ser bem-sucedido nisso. E as demais alegações?

Podem dar algum trabalho aos acusadores de Cunha. A defesa alega que a Operação Catilinárias, deflagrada pela PF e pelo MPF, que colheu novos indícios contra o deputado, foi deflagrada “no curso do prazo para a sua defesa”, o que viola o devido processo legal. Nesse caso, argumentam os advogados, as provas não poderão ser usadas, sob risco de nulidade do processo.

Vamos ver. O prazo de defesa de Cunha estava em curso? Estava. Há restrições legais em casos assim? Há. O MPF, que tem de se manifestar sobre o pedido e certamente vai se opor, deve alegar que Cunha não era “o” alvo e que eventuais novos indícios contra ele foram uma contingência da operação.

Eu diria que a primeira alegação é um despropósito; a segunda pode render algum calor, mas tende a ser recusada, e a terceira, bem…, a terceira realmente provoca um bom debate jurídico.

No ambiente de delação premiada, Júlio Camargo, de fato, negou que Cunha tivesse recebido propina. A afirmação foi feita depois, em depoimentos complementares. Qualquer advogado sabe que, nesse caso, ele ficou no estranho e inusitado papel de réu e de testemunha a um só tempo, o que, evidentemente, coloca uma questão para o mundo do direito.

Só para lembrar: Rodrigo Janot já entrou com uma ação cautelar no Supremo para que Eduardo Cunha seja afastado da Presidência da Câmara.

A Procuradoria Geral da República não se manifestou sobre a petição da defesa de Cunha porque disse que o fará nos autos.



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