É claro que não se devem tomar os números do Datafolha como antecipadores do que vai acontecer em 2018. Ainda é muito cedo, como todos sabemos. A realidade, nem é preciso que eu demonstre isso, anda muito mais dinâmica do que poderia ser de nossa escolha. Países com estabilidade institucional têm muito menos solavancos. Esse frenesi permanente na política brasileira não é prova de saúde institucional, não. Ao contrário. É sinal de que estamos com problema.
Assim, não há de se tomar Lula como forte candidato ou Marina Silva como virtual eleita. Falta muita coisa. Mas é inequívoco que essa sensação de fim do mundo, de fim dos tempos, que estamos experimentando induz uma recuperação das esquerdas. A razão tristemente óbvia: se todos são iguais, então por que foi mesmo que o PT foi transformado na personagem central do petrolão?
Bem, eu acho que o PT foi e é a personagem central, junto com Lula, o seu grande protagonista. Ocorre que a gritaria contra os políticos, ainda que compreensível, está levando muita a gente a concluir que o mal é bem maior. Outro dia, um desses intelectuais de palpites fáceis, resolveu criticar a índole do próprio brasileiro. Parecia que ele estava sugerindo que a corrupção entre nós é mesmo uma cultura.
Lula pode nem conseguir se candidatar, ainda falarei a respeito, e muita coisa pode vir por aí, a mudar esse quadro. Mas já se percebeu que fatias consideráveis da população podem, sim, mudar de humor com certa celeridade e, em vez de tomar o caminho da mudança radical, migrar para uma posição de certo conforto moral, onde estava antes dessa crise.
Qual é o ponto fulcral? Notem: Dilma só está fora porque cometeu crime de responsabilidade e porque perdeu completamente a interlocução no Congresso. Ficou sem condições políticas de governar. No oposto complementar da atual realidade política, Temer só é presidente porque é essa a solução constitucional, mas também porque as forças que o amparavam no Congresso conseguiram se ajustar com milhões de brasileiros que pediam mudança.
A aliança tácita de milhões que queriam o impeachment com o Congresso que lhes deu o impeachment era apenas episódica, frágil, superficial. Foi relativamente fácil abalá-la ou mesmo rompê-la. Disso se encarregou o Ministério Público Federal, com a sua pauta política e o seu protagonismo. Os movimentos de rua, aos quais sobra disposição, mas ainda falta um tanto de teoria, não perceberam a tempo que só uma força lucra com essa fratura: as esquerdas, especialmente o PT.
Marchar contra a política, contra os políticos, contra as ditas forças tradicionais (e seus sinônimos) corresponde a entregar o ouro para o bandido. A razão é simples: sem a soma das ruas — depurada do excesso de entusiasmo — com os ditos “políticos” tradicionais, não se faz, por exemplo, reforma da Previdência, aquela de que Lula e as esquerdas não querem nem ouvir falar.
Combater a corrupção não é programa de governo ou ponto de chegada, mas mero instrumento de política pública. Antes de mais nada, é uma obrigação. As tarefas de um governante são imensamente maiores e mais complexas do que isso.
À medida que o processo político se mostra refém do Dia da Marmota, em que cada um parece repetir o anterior, com a sua rotina de operações espetaculares, sua fila de corruptos comprovados ou presumidos e sua rotina de permanente assalto aos cofres públicos, a desesperança vai se somando ao enfaro. A indignação vai cedendo espaço, então, ao fatalismo. “Ah, o Brasil é assim mesmo…”
É esse quadro que devolve as esquerdas ao jogo. E elas estão de volta, isso é inequívoco. Aproveitam-se, em boa parte, da ingenuidade e da inexperiência daqueles que, com tanta força e galhardia, lhes fizeram oposição, mas que se deixaram enredar, também, por forças nem tão ingênuas.
As instituições não podem ser submetidas a permanentes insultos, confundindo-se o justo combate à corrupção com o combate à ordem legal. Em situações assim, emerge um certo desejo de ordem de inspiração e aspiração autoritárias, que pode sonhar com um demiurgo por ora desconhecido, ou pode se voltar para o passado, tocado por certa nostalgia. Sim, refiro-me a Lula.
Sua eventual candidatura em 2018, se a estabilidade precária durar até lá, tem desafios jurídicos imensos. Tratarei do assunto. O ponto não é esse.
Nós é que precisamos buscar um lugar do discurso e da prática política que seja, sim, implacável com a corrupção, mas conseguindo distinguir as instituições das pessoas.
Sem isso, ganham os porta-vozes do caos.
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