É claro que o governo obteve uma vitória importante ao conseguir, aprovar, em segunda votação no Senado, a PEC que institui o teto de gastos federais. Mas também não é menos verdade que se viu ali um sinal de advertência. Por que isso? Na primeira rodada, o texto passou por 61 votos a 14. Desta feita, os favoráveis foram 53 — apenas 4 a mais do que o mínimo necessário para aprovação: 49 — o que corresponde a três quintos (60%) dos 81 senadores. Os contrários somaram 16.
Notem: quando se fala em “apenas” quatro votos a mais, tende a se ignorar que um placar de 49 já é muito expressivo. E difícil de atingir. Por isso mesmo o legislador escolheu esse mínimo elevado para a mudança constitucional. Vale dizer: esta só acontece se houver um consenso razoável. Mas não dá para ignorar que houve oito votos a menos.
Houve 10 ausências de parlamentares da base do governo. Desse grupo, oito haviam aprovado o texto na primeira jornada e, desta feita, sumiram. São eles: Jader Barbalho (PMDB-PA); João Alberto (PMDB-MA); Rose de Freitas (PMDB-ES); David Alcolumbre (DEM-AP); Marcelo Crivella (PRB-RJ); Zezé Perrella (PTB-MG); Fernando Collor (PTC-AL); Wilder Morais (PP-GO).
E houve um que mudou de lado: Dario Berger (PMDB-SC) havia dito “sim” da primeira vez e agora rejeitou o texto. Vai saber o que ele descobriu entre uma votação e outra. Como se nota, o governo perdeu, na verdade, nove votos, mas acabou ganhando um, daí a diferença de 8 “sins” entre a primeira e a segunda jornadas. Telmário Motta (PDT-RR), ausente na votação anterior, aprovou o texto desta feita.
Não creio que os nove votos perdidos de uma etapa para outra estejam ligados a reivindicações cartoriais. A votação ocorreu num dia difícil, com uma pesquisa Datafolha na praça indicando que 60% dos entrevistados são contrários à PEC, ainda que se possa duvidar que a larga maioria soubesse exatamente do que se tratava. Houve manifestações violentas contra a aprovação do texto em São Paulo e Distrito Federal.
É claro que isso antecipa dificuldades que o governo terá no futuro para aprovar, por exemplo, a reforma da Previdência. Seu potencial para uma mobilização contrária é muito superior ao da PEC do Teto, que tende a atrair o protesto das esquerdas mais radicalizadas. Os que vão às ruas contra o teto têm uma pauta ideológica. Já a aposentadoria diz respeito à vida da quase totalidade dos brasileiros.
O governo comemorou, com razão, o resultado, mas não ignora as dificuldades que têm pela frente.
Ah, sim! Cumpre notar que a PEC só foi aprovada nesta terça-feira porque o Supremo derrubou a patuscada de Marco Aurélio Mello e cassou a liminar que afastava Renan Calheiros (PMDB-AL) da Presidência do Senado. Se, na cadeira de presidente, estivesse Jorge Viana (PT-AC), o texto não teria sido votado. E o PT estaria em festa.
Não custa deixar claro: eu não acho que o STF fez bem em cassar a liminar só porque era preciso aprovar a PEC. Agiu corretamente porque era simplesmente ilegal.
Ou por outra: avança-se um pouco rumo à racionalidade, apesar de Marco Aurélio e daqueles que não entenderam que o Supremo apenas cumpria a lei.
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