Nesta quinta, duas figuras de grande visibilidade no debate público fazem o que se deve fazer numa democracia: vão ao embate de ideias. Em vez de criar zonas de interdição do pensamento; em vez de apelar ao medo e à irracionalidade; em vez de convocar plebiscitos de baixo moralismo, em que a lei é a última questão a ser levada em conta, assistir-se-á a um confronto de posições. Por esse caminho, sim, se pode avançar.
A quem me refiro? A Gilmar Mendes, ministro do Supremo e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e ao juiz Sérgio Moro, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba e símbolo-maior da Lava Jato, que, infelizmente, está assumindo uma conotação política nem sempre virtuosa porque vista como uma espécie de polo oposto ao Congresso, o que não é bom.
Os dois atenderam a um convite do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDM-AL), e estarão na Casa nesta manhã para debater o projeto (íntegra aqui) que muda a lei de abuso de autoridade, a 4.898, que é de 1965.
Algumas coisas precisam ser lembradas. Esse texto, que está tramitando no Senado, foi originalmente apresentado à Câmara em 2009, cinco anos antes, portanto, de vir à luz a Operação Lava Jato. Trata-se, pois, de uma mentira e de uma vigarice intelectual afirmar que tal texto foi concebido para criar limites à operação.
Mais: o projeto de lei foi elaborado por uma comissão de notáveis a pedido do então presidente do Supremo e do Conselho Nacional de Justiça — justamente Gilmar Mendes, este que estará lá debatendo. Integraram a equipe o então desembargador Rui Stocco; Everardo Maciel, ex-secretário da Receita; Luciano Felício Fuck, assessor de Mendes ainda hoje, e Teori Zavascki, então ministro do STJ. Quis o destino que Teori se tornasse o relator do petrolão. Alguém ousaria acusá-lo de parcialidade na condução do processo?
Mais de uma vez, Sérgio Moro, Rodrigo Janot e Deltan Dallagnol, entre outros, acusaram o texto de ameaçar a Lava Jato e as investigações. Infelizmente, nunca disseram em que trecho. Nesta quinta, o juiz terá a oportunidade de esclarecer: “Olhe, no artigo tal, está escrito tal coisa, que é ruim porque…” E então se vai avaliar: se ele tiver razão, que se ajuste a redação. Melhor ainda: havendo a suspeita de algo que possa agredir as justas prerrogativas de autoridades de investigação, que se mude o texto.
O que não é possível é o debate ficar na base apenas do terror e do medo: “Olhe, a lei é ruim para a Lava jato” — mas sem dizer em que parte exatamente.
Eu já li e reli o texto. Até agora, não vi nada. Mas ouvirei Moro com atenção. A única reserva explícita que o vi fazer foi a de que, agora, não é hora de ter uma lei mais severa que combata abuso de autoridade. A fala é ruim porque sugere, por óbvio, que existe uma hora em que o abuso de autoridade é desejável. Certamente ele não quis dizer isso.
Mas eis aí: melhor o debate do que a plantação e a fofoca. Ele, sim, pode gerar luz, não apenas o calor com que se pretende infamar as ruas. Melhor o esclarecimento do que a pregação, certo? Deixem esta para as religiões, para as igrejas.
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