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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Marina não quer o impeachment, mas cobre sua opinião oportunista com glacê retórico

Nossa Mãe do Céu! Marina Silva, líder da Rede, concedeu uma entrevista à Folha, publicada nesta segunda. Está mais, como vou dizer?, “Marina” do que nunca. Impeachment? Esqueçam! Ela chega a dar uma resposta que ofende os fatos e os milhões de pessoas que foram às ruas. Afirmou:
“No momento estou focada no que é melhor para o Brasil, o processo que está vindo das investigações. Até porque o impeachment conduzido pelo presidente [da Câmara, Eduardo] Cunha [PMDB]… [ri]. Ele deveria estar propondo o seu próprio afastamento. Do ponto de vista da credibilidade do processo, as investigações trazem a materialidade dos fatos. Impeachment não se fabrica, ele se explicita em função dos fatos que o justificam. Não se muda o presidente da República simplesmente porque a gente discorda dele. E, neste momento, as contribuições mais relevantes vêm das investigações.”

Em primeiro lugar, afirmar que o impeachment é conduzido por Cunha é má-fé ou ignorância. Escolham. A admissão inicial da denúncia só pode ser feita pelo presidente da Câmara, pouco importa quem seja. Marina repete a ladainha asquerosa do PT, segundo a qual querem destituir Dilma apenas por discordância política. Como sempre, usa uma enxurrada de palavras sem significado nenhum. Que diabos quer dizer isto: “impeachment não se fabrica, ele se explicita em função dos fatos que o justificam”? Eu explico. Não quer dizer nada. A líder da Rede finge ignorar que o impedimento é também um processo político. Se não houver quem o defenda e quem lute por ele, não cai do céu.

O que me irrita em Marina, já afirmei aqui algumas vezes, nem tanto é a parte compreensível de suas postulações — as incompreensíveis devem ser obra do Espírito Santo, quando leva os homens à glossolalia —, mas o fato de que ela sempre sugere que políticos são os outros. Ela parece ser uma ungida, que veio a este mundo interessada apenas na verdade.

A política que não quer o impeachment diz defender, no entanto, o aprofundamento das investigações no TSE, sugerindo que vê com bons olhos a cassação da chapa que elegeu Dilma, o que impediria também o vice, Michel Temer, de assumir a Presidência.

Marina deve saber que a cassação da diplomação de Dilma pelo TSE está bem mais longe do que o impeachment. Mais longe no tempo e até na viabilidade política. Ela deveria é confessar o que nega: quer que Dilma fique até 2018 porque sabe que o governo, nessa hipótese, chegará em pandarecos ao fim do mandato. E o PT também estará bem estropiado.

Marina se prepara para ser a beneficiária do petismo desiludindo e dos votos difusamente de esquerda, que, à falta de algo melhor ou mais claro, vai ficando com o PT mesmo. A sua rejeição ao impeachment nada tem de inocente — no sentido da convicção pura, da verdade d’alma. É só uma estratégia.

A líder da Rede pode ser tudo, mas burra não é. A eventual ascensão do PMDB, no caso do impeachment de Dilma, pode ser uma primeira deslocada do eixo da política para, vá lá, um campo que se poderia dizer “centro-liberal”. Imediatamente, forças importantes convergiriam para ele. E aquela que se quer um ser um tanto acima da política prefere, obviamente, articular um eixo à esquerda. Melhor pra ela que Dilma fique no cargo. Aposta que os zumbis ditos “progressistas” sairão em busca de um novo “Silva” — ou uma nova Silva.

Na Folha Online, há a integra da entrevista. Imensa! Gigantesca! Borrascosa. E não se consegue tirar da distinta senhora uma definição mínima do que seja a Rede.

Instada a dizer o que é o partido, cascateia:
“Há uma pressa em querer rotular tudo aquilo que está surgindo como algo novo, antes que isso possa se estabilizar. No cenário político nacional, a Rede talvez seja um desses experimentos que de fato buscam fazer uma atualização política.”

Entendeu? Nem eu. Aí ela avança:
“Na década de 1980, o PT fez essa atualização. Havia ali uma profunda estagnação das estruturas sindicais, do processo político dentro da própria esquerda tradicional, dos partidos marxistas-leninistas com estruturas verticalizadas e centralismo democrático. O PMDB era aquele condomínio que já não conseguia suportar seu próprio peso, e o PT surge naquele momento fazendo uma atualização da política, inclusive com muita gente apressada em rotulá-lo.”

Atualização? O PT surgiu em 1980 pedindo mais estado na economia, no mesmo ano em que Ronald Reagan venceu a eleição nos EUA. Margaret Thatcher tinha sido eleita primeira-ministra no Reino Unido no ano anterior. O PT já nascia como uma velharia — essa velharia que agora nos condena ao atraso.

Convidada uma vez mais a se definir, responde assim:
“Nós somos a busca de uma síntese. O mundo não pode se resumir ao socialismo e ao capitalismo. Aliás, esse impasse que o mundo hoje está vivendo é porque nós fechamos as possibilidades da realidade, que são múltiplas, em apenas dois paradigmas. É preciso estar aberto para os paradoxos. Estamos buscando uma nova síntese (…)”.

De fato, o mundo não pode se resumir a socialismo e capitalismo porque o primeiro está morto. A teorização pedestre de Marina produz a seguinte síntese:
“Uma grande contribuição foi dada pelo capitalismo, avanços que devem ser preservados. O grande questionamento feito pelo socialismo quanto às iniquidades sociais, isso deve ser preservado.”

Tratar o capitalismo e o socialismo como contribuições que o passado da humanidade nos legou é uma inverdade que chega a ser criminosa, dados os muitos milhões que as esquerdas mataram em sua trajetória. Inferir que o socialismo surge do inconformismo com as iniquidades é, na hipótese benigna, ignorância.

Bem, eu não esperava, confesso, nada muito melhor do que isso. Mas eu a convido a dizer com mais clareza: “Para a minha estratégia para chegar ao poder, o melhor é que Dilma fique na Presidência, sendo esfolada pelos fatos, porque eu quero herdar o eleitorado de esquerda e dito progressista.”

O resto é conversa dos espíritos ignotos da floresta.



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