José Eduardo Cardozo se tornou um dos homens mais patéticos da República. Aponto três razões principais. De saída, note-se que é odiado por parcela significativa do PT, a começar de Lula, que o considera contraproducente. O companheiro-chefe gosta de menos retórica e mais truculência.
Em segundo lugar, mas não em ordem de importância, Cardozo pretende falar como um jurista, não como um militante. Busca dar às suas opiniões certa inflexão legalista, o que o expõe ao ridículo porque qualquer pessoa com um mínimo de afinidade com a área logo percebe a farsa. Em terceiro lugar, poucas pessoas na vida púbica lidam tão mal com o pensamento lógico. Tiririca lhe dá de 7 a 1 em coerência discursiva. Vamos ver.
Este senhor já cometeu o ridículo de apresentar a defesa da presidente Dilma na Comissão Especial do Impeachment — e notem que um advogado qualquer poderia fazê-lo, inclusive um contratado pela senhora Dilma Rousseff — alegando, na prática, tratar-se de um tribunal de exceção com vistas a dar um golpe.
Ora, ou bem se reconhece o tribunal ao qual se apresenta a defesa — e, portanto, acata-se ou resultado — ou bem não se aceita. Afinal, estamos numa democracia, e Cardozo não foi conduzido à Câmara por um guarda pretoriana. Mas digamos, ainda assim, que o governo opte por usar o espaço da comissão para denunciar o tal “golpe”. Que, ao menos, outro o fizesse, não um autoridade da República, que não pode reivindicar a estúpida condição de homem de Estado que despreza o que é uma instância de… Estado! Isso deveria ser suficiente para devastar a inteligência de alguém sensato.
Não contente, Cardozo agora decidiu desqualificar o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), que é sensato a mais não poder, atendo-se exclusivamente aos crimes fiscais cometidos pela presidente Dilma no curso deste mandato, dispensando-se de incluir entre os motivos que devem conduzi-la ao impedimento as lambanças na Petrobras.
Mesmo assim, Cardozo saiu vociferando, como se lhe coubesse tal papel — e não cabe! —, e acusa o texto de ser “inconsistente” e de “induzir a erro”. Ou ainda: “É uma posição política que não tem lastro nenhum na Constituição”. Afirmou:: “A cada passo, vai se construindo a ideia de que é um processo político”.
A afirmação impressiona pela desonestidade intelectual. O processo de impeachment tem de ter base jurídica — e tem: é fora de questão que as pedaladas constituam crime de responsabilidade —, mas o seu desdobramento, que conduz ao processo e ao julgamento, é, de fato, político. E isso não quer dizer “arbitrário”. Político não fosse, o tribunal a julgar Dilma seria o STF, não o Senado.
Segundo Cardozo, o relator evitou tratar de um dos principais argumentos da defesa: Eduardo Cunha (PMDB-RJ) só teria acatado o pedido por “vingança”. Mas é o próprio advogado geral quem diz: “O primeiro argumento [do relator] é que o STF teria dito que não se aplica ao presidente da Câmara a suspeição ou impedimento. Ora, ninguém falou de suspeição ou impedimento. O que nós falamos é que foi uma vingança, essa foi a causa e finalidade jurídica para abertura do processo”.
Que preguiça a desonestidade intelectual me causa!
Ora, como é que ninguém falou de suspeição de impedimento? Falou, sim! Tanto o PT como PC do B recorreram ao Supremo. E quebraram a cara. Mais: se o próprio Cardozo entende que não cabe arguir a suspeição de Cunha — porque juridicamente descabia —, o que o relator da Comissão do Impeachment deveria ter levado em conta? Conversa de comadre? “Vingança”? A palavra parece ser mais apropriada ao faroeste ou ao drama amoroso.
Em direito, ou Cunha estava impedido de aceitar ou não estava. Se não estava, carregava a competência para decidir. Dispondo dela, poderia dizer “sim” ou “não”. Ou Cardozo estaria alegando motivações subalternas se o outro tivesse rejeitado a denúncia? O doutor é uma piada ambulante.
Cardozo também deu para falar coisas estranhas:
“Há uma irregularidade processual flagrante. Uma pessoa, para apresentar sua defesa, precisa saber do que está sendo acusada. Estamos num processo de impeachment em que se discute a existência de um mandato. Do que é acusada, afinal, a presidente da República?”
Ora, Cardozo, no processo em curso, ela é acusada de ter violado o Inciso VI do Artigo 85 da Constituição: atentar contra a lei orçamentária. E as provas são escandalosamente claras. Sei que está saindo muito barato. Infelizmente, para evitar chicanas jurídicas, evitou-se agregar à denúncia o que se sabe de delatores premiados como Delcídio do Amaral, Nestor Cerveró e Fernando Baiano. Mais: também não se cuida dos crimes de responsabilidade cometidos desde a nomeação de Lula, incluindo a própria (ainda volto ao tema).
O relator respondeu a Cardozo: disse que os que não estão satisfeitos com o relatório podem recorrer a Justiça se veem alguma irregularidade. O Planalto, por enquanto, decidiu evitar esse caminho porque não teria como evidenciar as eventuais ofensas à ordem legal.
De resto, dizer o quê? Dilma e seus subordinados morais estão dizendo que há um golpe em curso no Brasil. É mesmo? Por que, então, ela não tenta decretar Estado de Defesa ou Estado de Sítio, conforme lhe faculta a Constituição? Ora, porque é mentira. Da mesma sorte, cumpre indagar: se o relatório é o que diz Cardozo, por que não vai ao Supremo já? Porque ele sabe que seria derrotado. E o PT só reconhece tribunal que lhe dê a vitória, certo?
Só por isso Cardozo está chiando.
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